Cariocas já fazem planos para as notas encontradas em mergulhos na Urca
Ele
jura que não é história de pescador. Para provar que encontrou R$ 45
mil em um mergulho no mar da Urca, domingo, Roberto Pereira, de 42 anos,
convida para um passeio no barco. E mostra, feliz, o material comprado
para reforma da embarcação: R$ 3.280 em madeira e R$ 4.200 em fibra. Ele
já pensa no resto do material. Um presente de Natal vindo do mar, diz o
pescador.
Domingo, Roberto foi um dos primeiros a se
lançar à caça do tesouro. Desde o fim de semana, dezenas de pessoas já
caíram nas águas em busca de pilhas de notas de R$ 50 e R$ 100 que
misteriosamente apareceram perto da orla do bairro. De manhã, foi
alertado por uma marinheira de que tinha dinheiro boiando embaixo na
ponte sobre o Quadrado da Urca. Pegou seu equipamento de mergulho e caiu
na água.
Anderson Aquino vai usar o dinheiro para comprar ração para Crom, o pitbull xodó dos pescadores Foto: Marcelo Theobald
— Eram quatro pacotes de R$ 10 mil. Tinha muita nota rasgada boiando também — conta Roberto.
Em cada barco do Quadrado, tem uma história sobre o aparecimento das notas.
—
Encontrei R$ 1.250. Vou comprar tudo em ração de primeira pro Crom
(pitbull que é o xodó dos pescadores) — contava Anderson de Aquino, de
40 anos.
O oceanógrafo José Lailson Brito não arrisca um
palpite sobre a origem do dinheiro, mas explica que a Urca fica numa
área “marginal” da baía, onde as correntes marítimas não são tão fortes.
Para os pescadores, o dinheiro foi lançado em uma área próxima. E
aparece quando a maré sobe. Alguns juram que notas já foram vistas
boiando há um mês, mas “ninguém deu confiança”. Até virar um fenômeno.
Grana está na conta
Se
ainda havia alguma dúvida se as notas eram verdadeiras, hoje os
caçadores do tesouro da Urca estão aliviados. Já mostram os comprovantes
de depósito do dinheiro encontrado nas águas. O mergulhador Adriano
Guimarães, de 36 anos, encontrou R$ 10,2 mil no fundo do mar, a uma
profundidade de quatro metros.
— Eu faço caça submarina, fui para lá com o equipamento e encontrei o pacote amarrado com elástico — conta.
Ontem,
no Morro Santo Amaro, onde mora, todo mundo comentava a história do
pescador. Ele e dois amigos que ajudavam nas buscas vão repartir a
quantia por três. Depositaram R$ 8.650 em uma conta e os R$ 1.550
restantes dividiram na hora. Roberto diz que agora está mais difícil
trocar notas:
— Deixei secar e fui na Caixa Econômica
trocar. Cheguei a dizer que estava roída de barata. Diz que lá não estão
mais trocando não.
Saudosismo
Quem
vê as notas chegarem sente saudades de antigas estações: “O verão da
lata foi muito melhor. Aqui na Urca chegaram várias. É o segundo
presente que vejo o povo receber do mar”, conta o professor de stand up
paddle Leandro Guerra, de 55 anos. Uns se lembram do verão de 1987,
quando milhares de latas de maconha foram despejadas de um navio e
chegaram à orla carioca. Outros dizem que o dinheiro foi oferenda de
Eike Baptista ou até “propina do Cabral”.
Desespero
Alex
Conceição andava pelas pedras quando pensou ter visto um papel azul
boiar no mar. Pulou de roupa e tudo à procura da nota de R$ 100, com a
pochete e o celular em punho, sem medir os danos ao eletrônico, que não
ligava após o mergulho. Era plástico. E tem gente com medo de botar a
mão nas notas. Dizem os supersticiosos que tudo que é lançado ao mar
pertence a Iemanjá e não traria sorte pegar. Mas a maioria é cética e
pega.
À caça
O funcionário público
Gilberto Alves Pereira veio de Xerém para se divertir na pesca
submarina: “É meu primeiro dia na caça. Procurei por 1h30m e não
encontrei nada”, explicou o fiscal, de roupa neoprene, que alertava
curiosos sobre o perigo da hipotermia e das pedras.
Superlua
Há
quem bote na conta da superlua o aparecimento das notas. Dizem na orla
que o fenômeno — aliado aos ventos e à mudança do tempo — mexeu com a
maré e trouxe as notas para perto da praia.
Recente
Para
o oceanógrafo José Lailson Brito, as notas devem ter sido lançadas há
pouco tempo no mar: “Pelo que eu vi das fotos, as notas estão em bom
estado. Qualquer coisa em contato com a água muito tempo já ganha uma
coloração esverdeada, amarronzada, que é um filme de bactérias e algas.
Matéria orgânica, como papel, se degrada rápido, mesmo as notas que
passam por um tratamento especial”.
Madrugadores
Como
é tradição entre pescadores e mergulhadores, a caçada começa cedo. Os
primeiros se lançam às águas perto das 7h, quando a visibilidade é
melhor para encontrar as notinhas. O Quadrado já virou local de
peregrinação. Garçons dos bares locais já orientam os curiosos que
procuram pelo “local do tesouro”. Pedaços de notas boiando no mar podem
ser vistos de longe.
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