Temer deve assinar 11 contratos na China, incluindo Petrobras e Embraer
BRASÍLIA
- No primeiro compromisso oficial após ser efetivado no poder, o
presidente Michel Temer fará cinco discursos na China para mostrar que
houve uma guinada política e econômica no país. Na reunião do G20 (grupo
que reúne as 20 maiores economias do mundo), ele ressaltará as
diferenças em relação ao governo passado, tanto no controle das contas
públicas e da inflação quanto na retomada do crescimento.
Já
na agenda preparada exclusivamente para azeitar as relações do Brasil
com os chineses, nos níveis empresarial e de Estado, Temer e a equipe de
ministros que o acompanham nessa jornada assinarão 11 atos, aos quais O
GLOBO teve acesso. São negócios bilionários, como a venda de 50 aviões
da Embraer, investimentos de US$ 1 bilhão na Petrobras, construção de um
grande terminal de cargas e uma siderúrgica no Maranhão e até a venda
para o chineses da participação da Camargo Correa na CPFL Energia, por
US$ 1,83 bilhão.
Com esses acordos, Temer quer marcar uma nova
fase de entradas de recursos no Brasil e reativação da economia. No
entanto, terá de dar várias justificativas sobre a cena política e
refutar a ideia de golpe. E ainda enfrentará temas complicados, como o
reconhecimento da China como economia de mercado.
A agenda do
presidente é extensa. No primeira sessão de trabalho, no domingo (4 de
setembro), ele admitirá aos demais chefes de Estado que o desafio mais
urgente do país é fiscal. No discurso, prometerá ao mundo que o gasto
público no país não terá crescimento real nos próximos 20 anos por causa
da emenda constitucional que está no Congresso Nacional.
Sem
citar diretamente a ex-presidente Dilma Rousseff, ele alfinetará o
antigo governo. Falará que, agora, o Banco Central tem atuado de forma
decisiva para trazer a inflação para o centro da meta, o que não ocorreu
em “anos recentes”. Dirá também que uma ambiciosa agenda de reformas
estruturais está em curso e que o que já foi feito mudou radicalmente as
expectativas, o que mexe com a economia. O presidente afirmará que o
Brasil já vive, hoje, uma alta do nível de confiança dos agentes
econômicos, queda no custo de financiamento externo, redução de risco
país, o aumento do fluxo de dólares e de investimento e também
ressaltará o "desaparecimento" do rombo das contas externas.
BIOECONOMIA E BIOENERGIA
Na
segunda-feira, o foco de Michel Temer será a energia elétrica. Dirá que
o país está pronto para cooperar na construção de uma plataforma
internacional para desenvolver a bioeconomia e a bioenergia avançada e
sustentável. Num discurso voltado para o meio ambiente, argumentará que
não há um plano B para o mundo a não ser investimento em energia limpa.
Nesse mesmo dia, o presidente falará em outro fórum que o mundo precisa
discutir os subsídios agrícolas e remover barreiras comerciais para
países em desenvolvimento.
Em um almoço com chefes de Estados do
G20, Temer fará um discurso voltado para o social. Dirá que o G20 tem
responsabilidades e que é indispensável uma “solidariedade global
revigorada”.
Na quinta sessão de trabalho, o presidente
tratará de temas como as migrações, assunto em alta por causa dos
refugiados que rumam para a Europa. Defenderá política para
estabilização e desenvolvimento dos locais de origem desses fluxos
migratórios. Lembrará, por exemplo, que o Brasil recebeu de braços
abertos os haitianos - que não se enquadram na categoria de refugiados,
mas chegaram aos milhares ao país por diversas razões. Condenará o
terrorismo. E ainda falará sobre saúde. Lembrará que o Brasil quebrou a
patente dos remédios contra a Aids.Durante a viagem, o presidente
ressaltará que o mundo não se recuperou da crise mundial e que três
elementos têm merecido a atenção do governo brasileiro: a evolução do
preço das commodities, os reflexos das políticas monetárias
acomodatícias em países desenvolvidos e a volatilidade dos mercados
financeiros por causa do Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia)
e do terrorismo.
O governo brasileiro tem interesses específicos
nesta viagem. Com a China, o Brasil quer aumento das exportações do
agronegócio brasileiro inclusive por meio da habilitação de novos
estabelecimentos autorizados a exportar carne. Sublinhará a necessidade
de maior flexibilidade das autoridades chinesas na concessão de
autorização para as importações e a participação de empresas chinesas no
Plano de Investimentos em Infraestrutura.
OS ATOS QUE SERÃO ASSINADOS
Em
um seminário empresarial em Xangai, o Brasil deve assinar 11 acordos
comerciais, de acordo com informações levantadas pelo GLOBO. O primeiro
deles será uma operação de crédito de US$ 1 bilhão com um prazo de 10
anos entre a Petrobras e o China Eximbank. O financiamento é a primeira
parcela dos US$ 2 bilhões previstos num acordo assinado no ano passado. A
estatal, que tenta se reerguer depois da crise do escândalo de
corrupção e da queda do preço internacional do petróleo, tem todo o
interesse que esse acordo saia.
Também está previsto um ato que
trata da venda de 32 aeronaves para empresas de aviação chinesa. Uma
outra negociação é a aprovação pelo governo chinês da aquisição de 18
jatos pela empresa Hainan Airlines. A Embraer pediu apoio ao governo
brasileiro para que essa autorização saia o mais rápido possível.
Será negociada ainda a venda da participação da Camargo Correa na CPFL Energia. O negócio é avaliado em US$ 1,83 bilhão.
Um
acordo de investimento num terminal multicargas privado na região de
São Luís (MA) também deve ser fechado. Esse terminal terá a capacidade
instalada de 14 milhões de toneladas por ano para grãos, 3 milhões de
toneladas para celulose, 3,5 milhões de toneladas de fertilizantes e 3,6
milhões de toneladas de líquidos. O investimento será de US$ 1,5 bilhão
apenas na primeira fase. Ainda no Maranhão, o governo negocia a
instalação de uma siderúrgica na cidade de Bacabeira no valor de US$ 3
bilhões.
INFRAESTRUTURA
Há previsão de
acordos para parcerias com o Banco Modal para ser braço financeiro do
CCCC (China Communications and Construction Company Internacional) para
analisar e executar projetos na área de infraestrutura no Brasil;
criação de um fundo de US$ 1 bilhão dos grupos Pengin e Haitong para
investimento em armazenamento, logística e infraestrutura de escoamento
de grãos; e ainda a compra de 50,1% da sociedade de investimentos Rio
Bravo pelo Grupo Fosun.
Ambos países ainda acordarão medidas de
cooperação para ampliar o comércio bilateral, como antecipado pelo GLOBO
na semana passada.
CHINA E A ECONOMIA DE MERCADO
Para
fazer toda essa negociação, Michel Temer foi alertado sobre pontos
importantes da política interna da China. O slogan governamental daquele
país tem quatro pontos: construir uma sociedade modernamente próspera,
aprofundar reformas, implementar o Estado de direito e aumentar a
disciplina partidária.
No que se refere à liberdade de expressão,
assessores do Palácio do Planalto ressaltaram ao presidente que centenas
de advogados chineses foram detidos e se tornaram frequentes casos de
assédio e intimidação a críticos do governo e a funcionários e
organizações não governamentais.
O governo chinês tem promovido
uma campanha de combate à corrupção com prisão de diversos líderes
partidários. Tem enfatizado que a unidade e lealdade é o ponto
fundamental para o partido para os rumos da economia da política
chinesa.
Sobre o reconhecimento efetivo de que a China é uma
economia de mercado, a orientação dada ao presidente — de acordo com
fontes ouvidas pelo GLOBO — é dar uma resposta padrão: a questão do
reconhecimento da China como economia de mercado para fins de
investigações de defesa comercial está em avaliação técnica pelo governo
brasileiro.
O tema é considerado sensível para a indústria
brasileira, porque parte das medidas de defesa comercia do Brasil contra
a China não seria possível se adotada a metodologia geral, aplicável a
economia de mercado (comparação com preço doméstico no país do produtor
investigado). No entanto, o tema é de alta prioridade do governo chinês,
que espera o reconhecimento do Brasil. Caso não seja dado, os chineses
podem reagir. A preocupação do governo é que haja represália. Um dos
exemplos é a possibilidade de a China abrir uma investigação antidumping
contra as importações de minério de ferro da Vale.
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