Em comissão especial de 21 integrantes, só cinco apoiam Dilma
BRASÍLIA
— O Senado elege hoje os parlamentares que formarão a comissão especial
que analisará o processo de impeachment em um cenário no qual a
presidente Dilma Rousseff conta com apenas cinco votos entre os 21
integrantes. Apesar da larga desvantagem, o governo e o PT dizem
acreditar em uma virada para evitar a admissibilidade do processo, que
levaria a um afastamento de Dilma por 180 dias. Mas já trabalham também
para que, no cenário de derrota, além de possíveis questionamentos no
Supremo Tribunal Federal (STF), como já admitiu o advogado-geral da
União, José Eduardo Cardozo, seja formado até um “tribunal
internacional” com juristas estrangeiros para acompanhar o julgamento
final no Congresso — uma estratégia sem valor jurídico para tentar
influenciar a opinião pública.
O comando do colegiado deve ficar
com uma dupla que tem a discrição como ponto em comum. Antonio Anastasia
(PSDB-MG) e Raimundo Lira (PMDB-PB), relator e presidente,
respectivamente, devem ser confirmados amanhã para as funções durante a
instalação da comissão. Os dois são descritos como extremamente leais a
seus partidos, o que significa que é dada como irreversível a posição
contra o governo. Os petistas criticam a indicação de Anastasia
justamente por afirmar que ele já tem “voto pronto” no caso. Anastasia é
o braço-direito do presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, em Minas
Gerais.
A eleição da comissão pelo plenário deveria ter ocorrido
semana passada, mas o PT conseguiu, com ajuda do presidente do Senado,
Renan Calheiros (PMDB-AL), adiar essa etapa. O governo quer alongar o
processo ao máximo porque, além da desvantagem na comissão, não teria
como resistir no plenário, onde a oposição precisa de 41 votos; e 48
senadores já se dizem a favor do afastamento, em enquete do GLOBO.
—
Tem clima de virada na sociedade e vamos para o debate. Temos os
argumentos do nosso lado, porque não há crime e há uma insegurança cada
vez maior com Michel Temer. Sabemos que é difícil, mas não jogaremos a
toalha — disse o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), um dos votos a favor
de Dilma.
O discurso de que ainda é possível evitar o afastamento
da presidente, porém, não impede a preparação para batalhas futuras.
Lindbergh conta que há uma articulação para reunir juristas de vários
países, que acompanhariam o processo e mostrariam que haveria uma
“fraude”.
— Começamos a fazer a articulação de uma rede
internacional. Queremos montar um tribunal paralelo de acompanhamento do
julgamento, com juristas das principais universidades do mundo. Os
grandes julgamentos sempre têm algo assim. Teremos esses juristas
emitindo pareceres para desmoralizar isso tudo como uma grande fraude —
diz o petista.
O parecer aprovado pela Câmara restringiu os fatos
apontados no processo de impeachment como crime de responsabilidade:
“pedaladas fiscais” de 2015 e decretos de crédito suplementar do mesmo
ano. Para o governo, no debate de mérito é possível demonstrar que isso
não sustentaria uma punição tão grave. O ministro José Eduardo Cardozo
já admitiu o recurso ao Supremo como alternativa.
Raimundo Lira já
anunciou que abrirá espaço para Cardozo falar na comissão e que
pretende usar o prazo máximo de dez dias úteis. Por esse cronograma, até
12 de maio deve ser tomada em plenário a decisão sobre a
admissibilidade e o consequente afastamento de Dilma. O líder do DEM,
Ronaldo Caiado (GO), critica o calendário:
— O Brasil derretendo e eles querendo procrastinar. Vamos ficar quase um mês nesta situação de um país sem governo.
Caiado
concorda que houve a restrição da denúncia contra Dilma aos temas de
2015. Afirma que a oposição não cometerá um “erro primário” de ampliar o
espectro. E acredita que, caso o tema seja levado ao Supremo,
dificilmente a Corte tomará qualquer decisão, uma vez que a Constituição
determina que cabe ao Senado decidir se houve crime de
responsabilidade.
O líder do DEM afirma ainda que o governo busca
uma “ingerência indevida” ao pedir ajuda internacional para defender
Dilma e questiona quem bancaria os juristas que reforçariam a estratégia
de defesa.
Futuro presidente da comissão, Lira é descrito por
parlamentares dos dois lados como fiel ao líder do PMDB, Eunício
Oliveira (PMDB-CE). Ele é suplente de Vital do Rêgo e assumiu após o
titular ter sido indicado para o Tribunal de Contas da União (TCU). É
parente por afinidade do ex-senador cassado Luiz Estevão de Oliveira. Já
passou por PDS, PRN — apoiou a eleição de Fernando Collor em 1989 — e
agora está no PMDB. Foi constituinte em 1988. Tinha anunciado voto
contra Dilma na comissão, mas pediu para ser tratado como “indeciso” e,
assim, ter a isenção necessária para a função.
Anastasia foi homem
forte de todos os governos de Aécio. Aos 26 anos, assessorou o relator
da Constituinte mineira Bonifácio Mourão. Aos 29, já professor na UFMG,
foi secretário-adjunto de Planejamento do governo Hélio Garcia. Sua
atuação em Minas o levou para Brasília, onde foi secretário-executivo
dos ministérios do Trabalho e da Justiça na gestão Fernando Henrique. Só
então teve o primeiro contato com o então deputado Aécio Neves. A
partir desse encontro, não se separaram: ele foi secretário de
Planejamento, vice de Aécio e seu sucessor.
O tucano chegou ao
Senado em fevereiro de 2015. Um mês depois passou a ser investigado na
Operação Lava-Jato, com base num depoimento do policial Jayme de
Oliveira Filho, o Careca. O policial disse ter entregado dinheiro numa
casa em Belo Horizonte, a pedido do doleiro Alberto Youssef, a uma
pessoa que se parecia com Anastasia. Em agosto de 2015, o
procurador-geral Rodrigo Janot pediu o arquivamento. Janot reiterou que
não há elementos para vincular o caso ao senador, e o ministro Teori
Zavascki arquivou o caso em fevereiro.
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