Delação de Machado inclui informações sobre arrecadação ilegal para políticos
BRASÍLIA — A delação do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado não
se resume a gravações de conversas que teve com o presidente do Senado,
Renan Calheiros (PMDB-AL), com o ex-presidente José Sarney (PMDB-AP) e
com o ex-ministro do Planejamento Romero Jucá (PMDB-RR). Numa série de
depoimentos prestados à Procuradoria-Geral da República, Machado falou
sobre a arrecadação de dinheiro de origem ilegal para políticos aliados,
entre eles Renan, Jucá e Sarney, segundo disse ao GLOBO uma fonte que
acompanha o caso de perto.
O acordo de delação de Machado foi
homologado pelo ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato
no Supremo Tribunal Federal (STF). Caberá ao procurador-geral, Rodrigo
Janot, decidir, a partir de agora, que medidas adotar para aprofundar as
investigações sobre as revelações do ex-presidente da Transpetro.
Parte
das gravações de conversas de Machado, divulgadas pela “Folha de S.
Paulo”, já derrubou Jucá do Planejamento. Até então, o ex-ministro era o
aliado mais próximo do presidente interino, Michel Temer.
DEPOIMENTOS À PGR
Ex-senador
pelo PSDB, Machado foi presidente da Transpetro de 2003 até o início do
ano passado. Ele se manteve no cargo mesmo depois de ter sido acusado
pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa de receber propina.
Como exemplo, Paulo Roberto Costa disse que ele próprio entregou
pessoalmente a Sérgio Machado R$ 500 mil. Subsidiária da Petrobras, a
Transpetro é a maior empresa processadora de gás natural e de transporte
de combustível do país. A arrecadação ilegal para políticos detalhada
por Machado estaria ligada a fornecedores da Transpetro.
Não foi
possível esclarecer até o momento se o ex-presidente da Transpetro falou
sobre arrecadação para campanha ou para benefício pessoal dos
personagens citados por ele. Na série de depoimentos, Machado se dispôs a
contar detalhes de todas as ilegalidades de que teve conhecimento, no
período em que comandou a estatal sob a proteção de um grupo de
políticos do Senado, entre eles alguns dos principais nomes do PMDB.
Certo de que o caminho que escolhera não teria retorno, Machado sentou
diante de investigadores da Procuradoria-Geral da República e respondeu a
todas as perguntas sem qualquer restrição. O ex-senador estava disposto
a contar tudo o que sabia de seus ex-padrinhos políticos.
Ele
não queria correr o risco de perder total ou parcialmente os benefícios
da delação como pode acontecer com delatores que fizeram acusações
seletivas. Machado decidiu partir para a delação no início do ano,
quando descobriu que o executivo de uma empreiteira apontou uma conta
usada por ele para movimentar dinheiro ilegal. A partir daí, ele passou a
gravar conversas e recolher provas das irregularidades de que teve
conhecimento, especialmente no período que presidiu a Transpetro.
Político experiente, Machado detém segredos de ex-aliados do PMDB e do
PSDB, partido ao qual foi filiado até deixar o Senado.
Procurada
pelo GLOBO, a assessoria de imprensa de Renan disse que o senador não
faria comentários até conhecer o conteúdo da delação de Machado. A
assessoria de Romero Jucá disse que o senador “nunca autorizou ninguém a
falar em nome dele sobre arrecadação de recursos para campanha”. O
GLOBO tentou, sem sucesso, falar com a assessoria do ex-presidente
Sarney.
Machado gravou mais de três horas de conversas com
ex-aliados. Num dos diálogos, Renan conta a Sérgio Machado de uma
conversa que ele teve com o diretor de redação da “Folha de S.Paulo”,
Otávio Frias Filho, na qual o jornalista teria dito que houve “exageros”
do jornal na cobertura da Operação Lava-Jato. Otávio Frias Filho não
comentou. Na mesma gravação, o senador afirma que Dilma conversou, antes
de ser afastada da Presidência, com o vice-presidente Institucional e
Editorial do Grupo Globo, João Roberto Marinho. De acordo com Renan, a
petista teria dito ao empresário que os veículos do Grupo Globo “tratam
diferentemente de casos iguais”.
“Conversa muito ruim, a conversa
com a menina da ‘Folha’... Otavinho [Otávio Frias Filho] foi muito
melhor. Otavinho reconheceu que tem exageros, eles próprios têm cometido
exageros, e o João [provável referência a João Roberto Marinho] com
aquela conversa de sempre, que não manda. [...] Ela [Dilma] disse a ele
‘João, vocês tratam diferentemente de casos iguais. Nós temos vários
indicativos’. E ele dizendo ‘isso virou uma manada, uma manada, está
todo mundo contra o governo’”, relatou Renan.
Sobre o diálogo, em
outro trecho, Renan disse ainda que “a conversa dela (Dilma) com João
Roberto [Marinho] foi desastrosa. Ele disse para ela... Ela reclamou.
Ele disse para ela que não tinha como influir”.
Em nota, João
Roberto Marinho, vice-presidente Institucional e Editorial do Grupo
Globo, explicou que, como disse o presidente do Senado, Renan Calheiros,
é verdade que sempre que lhe pedem para interferir no noticiário, a
favor de um grupo ou de outro, a resposta é sempre a mesma: ele não pode
mandar que se interfira nos fatos, pois um veículo de imprensa deve
tudo noticiar livremente. Ele acrescentou que o compromisso do Grupo
Globo é com a notícia e com o público. Acrescentou que essa sua resposta
gera desconforto, frustrações e, por vezes, afirmações descabidas, o
que é compreensível, especialmente em momentos de crise.
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