Para Sarney, delação da Odebrecht seria ‘metralhadora de ponto 100’, diz jornal
BRASÍLIA
— A possibilidade de a empreiteira Odebrecht fazer uma delação premiada
na Operação Lava-Jato foi considerada "uma metralhadora de (calibre)
ponto 100" pelo ex-presidente José Sarney em conversa gravada por Sérgio
Machado, ex-presidente da Transpetro. Sarney relacionou a empresa a uma
ação que a presidente Dilma Rousseff, afastada do mandato pelo Senado,
teria feito durante a campanha eleitoral.
"Nessa caso, ao que eu
sei, o único em que ela (Dilma) está envolvida diretamente é que falou
com o pessoal da da Odebrecht para dar para campanha do... E
responsabilizar aquele (inaudível)", diz Sarney na conversa.
O ex-presidente também comentou que os escândalos na Petrobras revelados pela Lava-Jato eram responsabilidade do governo:
"Esse negócio da Petrobras, só os empresário que vão pagar, os políticos? E o governo que fez isso tudo, hein?", questionou.
Em resposta, Sérgio Machado disse que Lula havia acabado.
"O
Lula acabou, o Lula, coitado, deve estar numa depressão", concordou
Sarney que, na sequência, disse que Lula não recebeu solidariedade de
Dilma: e criticou o juiz Sérgio Moro:
"Nenhuma, nenhuma. E com esse Moro perseguindo por besteira".
Os
trechos do diálogo entre Sarney e Machado foram publicados pelo jornal
"Folha de S.Paulo". O ex-presidente é o terceiro político a ser gravado
por Machado, depois do senador Romero Jucá (PMDB-RR), que foi exonerado
do ministério do Planejamento quando o áudio tornou-se público, e o
presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
A eventual
delação premiada da Odebrecht já havia sido mencionada por Renan, em
áudio, após ser instigado por Machado. O presidente do Senado concordou
com a afirmação de Machado de que a empresa "vai tacar tiro no peito
dela, não tem mais jeito", em referência à Dilma. Renan respondeu: "Tem
não, porque vai mostrar as contas".
Leia a seguir a transcrição das conversas entre José Sarney e Sérgio Machado publicada pela "Folha de S.Paulo".
PRIMEIRA CONVERSA
SARNEY
- Olha, o homem está no exterior. Então a família dele ficou de me
dizer quando é que ele voltava. E não falei ontem porque não me falou de
novo. Não voltou. Tá com dona Magda. E eu falei com o secretário.
MACHADO
- Eu vou tentar falar, que o meu irmão é muito amigo da Magda, para
saber se ele sabe quando é que ela volta. Se ele me dá uma saída.
MACHADO- Presidente, então tem três saídas para a presidente Dilma, a mais inteligente...
SARNEY - Não tem nenhuma saída para ela.
MACHADO -...ela pedir licença.
SARNEY - Nenhuma saída para ela. Eles não aceitam nem parlamentarismo com ela.
MACHADO - Tem que ser muito rápido.
SARNEY - E vai, está marchando para ser muito rápido.
MACHADO - Que as delações são as que vem, vem às pencas, não é?
SARNEY - Odebrecht vem com uma metralhadora de ponto 100.
MACHADO
- Olha, acabei de sair da casa do nosso amigo. Expliquei tudo a ele
[Renan Calheiros], em todos os detalhes, ele acha que é urgente, tem que
marcar uma conversa entre o senhor, o Romero e ele. E pode ser aqui...
Só não pode ser na casa dele, porque entra muita gente. Onde o se nhor
acha melhor?
SARNEY - Aqui.
MACHADO
- É. O senhor diz a hora, que qualquer hora ele está disponível, quando
puder avisar o Romero, eu venho também. Ele [Renan] ficou muito
preocupado. O sr. viu o que o [blog do] Camarotti botou ontem?
SARNEY- Não.
MACHADO
- Alguém que vazou, provavelmente grande aliado dele, diz que na
reunião com o PSDB ele teria dito que está com medo de ser preso, podia
ser preso a qualquer momento.
SARNEY- Ele?
MACHADO
- Ele, Renan. E o Camarotti botou. Na semana passada, não sei se o
senhor viu, numa quinta ou sexta, um jornalista aí, que tem certa
repercussão na área política, colocou que o Renan tinha saído às pressas
daqui com medo dessa condição, delações, e que estavam sendo montadas
quatro operações da Polícia Federal, duas no Nordeste e duas aqui. E que
o Teori estava de plantão... Desculpe, presidente, não foi quinta não.
Foi sábado ou domingo. E que o Teori estava de plantão com toda sua
equipe lá no Ministério e que isso significaria uma operação... Isso foi
uma... operação que iria acontecer em dois Estados do Nordeste e dois
no sul. Presidente, ou bota um basta nisso... O Moro falando besteira, o
outro falando isso. [inaudível] 'Renan, tu tem trinta dias que a bola
está perto de você, está quase no seu colo'. Vamos fazer uma estratégia
de aproveitar porque acabou. A gente pode tentar, como o Brasil sempre
conseguiu, uma solução não sangrenta. Mas se passar do tempo ela vai ser
sangrenta. Porque o Lula, por mais fraco que esteja, ele ainda tem... E
um longo processo de impeachment é uma loucura. E ela perdeu toda...
[...] Como é que a presidente, numa crise desse tamanho, a presidente
está sem um ministro da Justiça? E não tem um plano B, uma alternativa.
Esse governo acabou, acabou, acabou. Agora, se a gente não agir... Outra
coisa que é importante para a gente, e eu tenho a informação, é que
para o PSDB a água bateu aqui também. Eles sabem que são a próxima bola
da vez.
SARNEY - Eles sabem que eles não vão se safar.
MACHADO
- E não tinham essa consciência. Eles achavam que iam botar tudo mundo
de bandeja... Então é o momento dela para se tentar conseguir uma
solução a la Brasil, como a gente sempre conseguiu, das crises. E o
senhor é um mestre pra isso. Desses aí o senhor é o que tem a melhor
cabeça. Tem que construir uma solução. Michel tem que ir para um governo
grande, de salvação nacional, de integração e etc etc etc.
SARNEY-
Nem Michel eles queriam, eles querem, a oposição. Aceitam o
parlamentarismo. Nem Michel eles queriam. Depois de uma conversa do
Renan muito longa com eles, eles admitiram, diante de certas condições.
MACHADO - Não tem outa alternativa. Eles vão ser os próximos. Presidente: não há quem resista a Odebrecht.
SARNEY - Mas para ver como é que o pessoal..
MACHADO
- Tá todo mundo se cagando, presidente. Todo mundo se cagando. Então ou
a gente age rápido. O erro da presidente foi deixar essa coisa andar.
Essa coisa andou muito. Aí vai toda a classe política para o saco. Não
pode ter eleição agora.
SARNEY - Mas não se movimente nada, de fazer, nada, para não se lembrarem...
MACHADO - É, eu preciso ter uma garantia
SARNEY
- Não pensar com aquela coisa apress... O tempo é a seu favor. Aquele
negócio que você disse ontem é muito procedente. Não deixar você voltar
para lá [Curitiba]
MACHADO - Só isso que eu quero, não quero outra coisa.
SARNEY - Agora, não fala isso.
MACHADO-
Vou dizer pro senhor uma coisa. Esse cara, esse Janot que é mau
caráter, ele disse, está tentando seduzir meus advogados, de eu falar.
Ou se não falar, vai botar para baixo. Essa é a ameaça, presidente.
Então tem que encontrar uma... Esse cara é muito mau caráter. E a crise,
o tempo é a nosso favor.
SARNEY - O tempo é a nosso favor.
MACHADO
- Por causa da crise, se a gente souber administrar. Nosso amigo, soube
ontem, teve reunião com 50 pessoas, não é assim que vai resolver crise
política. Hoje, presidente, se estivéssemos só nos três com ele, dizia
as coisas a ele. Porque não é se reunindo 50 pessoas, chamar ministros..
Porque a saída que tem, presidente, é essa que o senhor falou é isso,
só tem essa, parlamentarismo. Assegurando a ela e o Lula que não vão
ser... Ninguém vai fazer caça a nada. Fazer um grande acordo com o
Supremo, etc, e fazer, a bala de Caxias, para o país não explodir. E
todo mundo fazer acordo porque está todo mundo se fodendo, não sobra
ninguém. Agora, isso tem que ser feito rápido. Porque senão esse pessoal
toma o poder... Essa cagada do Ministério Público de São Paulo nos
ajudou muito.
SARNEY - Muito.
MACHADO
- Muito, muito, muito. Porque bota mais gente, que começa a entender...
O [colunista da Folha] Janio de Freitas já está na oposição,
radicalmente, já está falando até em Operação Bandeirante. A coisa
começou... O Moro começou a levar umas porradas, não sei o quê. A gente
tem que aproveitar ess... Aquele negócio do crime do político [de
inação]: nós temos 30 dias, presidente, para nós administrarmos. Depois
de 30 dias, alguém vai administrar, mas não será mais nós. O nosso amigo
tem 30 dias. Ele tem sorte. Com o medo do PSDB, acabou com el,e no colo
dele, uma chance de poder ser ator desse processo. E o senhor,
presidente, o senhor tem que entrar com a inteligência que não tem. E
experiência que não tem. Como é que você faz reunião com o Lula com 50
pessoas, como é que vai querer resolver crise, que vaza tudo...
SARNEY - Eu ontem disse a um deles que veio aqui: 'Eu disse, Olhe, esqueçam qualquer solução convencional. Esqueçam!'.
MACHADO - Não existe, presidente.
SARNEY- 'Esqueçam, esqueçam!'
Machado - Eu soube que o senhor teve uma conversa com o Michel.
SARNEY - Eu tive. Ele está consciente disso. Pelo menos não é ele que...
MACHADO - Temos que fazer um governo, presidente, de união nacional.
SARNEY
- Sim, tudo isso está na cabeça dele, tudo isso ele já sabe, tudo isso
ele já sabe. Agora, nós temos é que fazer o nosso negócio e ver como é
que está o teu advogado, até onde eles falando com ele em delação
premiada.
MACHADO - Não estão falando.
SARNEY - Até falando isso para saber até onde ele vai, onde é mentira e onde é valorização dele.
MACHADO
- Não é valoriz... Essa história é verdadeira, e não é o advogado
querendo, e não é diretamente. É [a PGR] dizendo como uma oportunidade,
porque 'como não encontrou nada...' É nessa.
SARNEY - Sim, mas nós temos é que conseguir isso. Sem meter advogado no meio.
MACHADO
- Não, advogado não pode participar disso, eu nem quero conversa com
advogado. Eu não quero advogado nesse momento, não quero advogado nessa
conversa.
SARNEY - Sem meter advogado, sem meter advogado, sem meter advogado.
MACHADO - De jeito nenhum. Advogado é perigoso.
SARNEY- É, ele quer ganhar...
MACHADO
- Ele quer ganhar e é perigoso. Presidente, não são confiáveis,
presidente, você tá doido? Eu acho que o senhor podia convidar, marcar a
hora que o senhor quer, e o senhor convidava o Renan e Romero e me diz a
hora que eu venho. Qual a hora que o senhor acha melhor para o senhor?
SARNEY - Eu vou falar, já liguei para o Renan, ele estava deitado.
MACHADO - Não, ele estava acordado, acabei de sair de lá agora.
SARNEY - Ele ligou para mim de lá, depois que tinha acordado, e disse que ele vinha aqui. Disse que vinha aqui.
MACHADO - Ele disse para o senhor marcar a hora que quiser. Então como faz, o senhor combina e me avisa?
SARNEY - Eu combino e aviso.
[...]
MACHADO - O Moreira [Franco] está achando o quê?
SARNEY - O Moreira também tá achando que está tudo perdido, agora, não tem gente com densidade para... [inaudível]
MACHADO
- Presidente, só tem o senhor, presidente. Que já viveu muito. Que tem
inteligência. Não pode ser mais oba-oba, não pode ser mais conversa de
bar. Tem que ser conversa de Estado-Maior. Estado-Maior analisando. E
não pode ser um [...] que não resolve. Você tem que criar o núcleo duro,
resolver no núcleo duro e depois ir espalhando e ter a soluç... Agora,
foi nos dada a chave, que é o medo da oposição.
SARNEY
- É, nós estamos... Duas coisas estão correndo paralelo. Uma é essa que
nos interessa. E outra é essa outra que nós não temos a chave de
dirigir. Essa outra é muito maior. Então eu quero ver se eu... Se essa
chave... A gente tendo...
MACHADO - Eu vou tentar saber, falar com meu irmão se ele sabe quando é que ela volta.
SARNEY - E veja com o advogado a situação. A situação onde é que eles estão mexendo para baixar o processo.
MACHADO
- Baixar o processo, são duas coisas [suspeitas]: como essas duas
coisas, Ricardo, que não tem nada a ver com Renan, e os 500, que não tem
nada a ver com o Renan, eles querem me apartar do Renan...
SARNEY - Eles quem?
MACHADO - O Janot e a sua turma. E aí me botar pro Moro, que tem pouco sentido ficar aqui. Com outro objetivo.
SARNEY
- Aí é mais difícil, porque se eles não encontraram nada, nem no Renan
nem no negócio, não há motivo para lhe mandar para o Paraná.
MACHADO
- Ele acha que essas duas coisas são motivo para me investigar no
Paraná. Esse é io argumento. Na verdade o que eles querem é outra coisa,
o pretexto é esse. Você pede ao [inaudível] para me ligar então?
SARNEY - Peço. Na hora que o Renan marcar, eu peço... Vai ser de noite.
MACHADO - Tá. E o Romero também está aguardando, se o senhor achar conveniente.
SARNEY - [sussurrando] Não acho conveniente.
MACHADO - Não? O senhor que dá o tom.
SARNEY - Não acho conveniente. A gente não põe muita gente.
MACHADO - O senhor é o meu guia.
SARNEY - O Amaral Peixoto dizia isso: 'duas pessoas já é reunião. Três é comício'.
MACHADO - [rindo]
SARNEY - Então três pessoas já é comício.
[...]
*
SEGUNDA CONVERSA
SARNEY - Agora é coisa séria, acho que o negócio é sério.
Machado
- Presidente, o cara [Sérgio Moro] agora seguiu aquela estratégia, de
'deslegitimizar' as coisas, agora não tem ninguém mais legítimo para
falar mais nada. Pegou Renan, pegou o Eduardo, desmoralizou o Lula.
Agora a Dilma. E o Supremo fez essa suprema... rasgou a Constituição.
SARNEY
- Foi. Fez aquele negócio com o Delcídio. E pior foi o Senado se
acovardar de uma maneira... [autorizou prisão do então senador].
Machado - O Senado não podia ter aceito aquilo, não.
SARNEY - Não podia, a partir dali ele acabou. Aquilo é uma página negra do Senado.
Machado - Porque não foi flagrante delito. Você tem que obedecer a lei.
SARNEY - Não tinha nem inquérito!
Machado - Não tem nada. Ali foi um fígado dos ministros. Lascaram com o André Esteves.. Agora pergunta, quem é que vai reagir?
[...]
Machado - O Senado deixar o Delcídio preso por um artista.
SARNEY - Uma cilada.
MACHADO - Cilada.
SARNEY
- Que botaram eles. Uma coisa que o Senado se desmoralizou. E agora o
Teori acabou de desmoralizar o Senado porque mostrou que tem mais
coragem que o Senado, manda soltar.
MACHADO -
Presidente, ficou muito mal. A classe política está acabada. É um
salve-se quem puder. Nessa coisa de navio que todo mundo quer fugir,
morre todo mundo.
[...]
SARNEY - Eu soube que o Lula disse, outro dia, ele tem chorado muito. [...] Ele está com os olhos inchados.
[...]
SARNEY
- Nesse caso, ao que eu sei, o único em que ela está envolvida
diretamente é que ela falou com o pessoal da Odebrecht para dar para
campanha do... E responsabilizar aquele [inaudível]
MACHADO
- Isso é muito estranho [problemas de governo]. Presidente, você pegar
um marqueteiro, dos três do Brasil. [...] Deixa aquele ministério da
Justiça que é banana, só diz besteira. Nunca vi um governo tão fraco,
tão frágil e tão omisso. Tem que alguém dizer assim 'A presidente é
bunda mole'. Não tem um fato positivo.
[...]
SARNEY
- E o Renan cometeu uma ingenuidade. No dia que ele chegou, quem deu
isso pela primeira vez foi a Délis Ortiz. Eu cheguei lá era umas 4
horas, era um sábado, ele disse 'já entreguei todos os documentos para a
Delis Ortiz, provando que eu... que foi dinheiro meu'. Eu disse:
'Renan, para jornalista você não dá documento nunca. Você fazer um
negócio desse. O que isso vai te trazer de dor de cabeça'. Não deu
outra.
MACHADO - Renan erra muito no varejo. Ele é bom. [...] Presidente, não pode ser assim, varejista desse jeito.
[...]
SARNEY
- Tudo isso é o governo, meu Deus. Esse negócio da Petrobras só os
empresários que vão pagar, os políticos? E o governo que fez isso tudo,
hein?
MACHADO - Acabou o Lula, presidente.
SARNEY - O Lula acabou, o Lula coitado deve estar numa depressão.
MACHADO - Não houve nenhuma solidariedade da parte dela.
SARNEY - Nenhuma, nenhuma. E com esse Moro perseguindo por besteira.
MACHADO - Tomou conta do Brasil. O Supremo fez a pedido dele.
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