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Após Pezão retirar pintura que dava ‘má sorte’, especialistas afirmam que problemas do Rio vão além de quadro na parede

Clarissa Monteagudo e Luã Marinatto
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A tela simboliza o capítulo inicial de uma história de mortes violentas por disputa de território no Rio: o primeiro governador-geral, Estácio de Sá, vítima de uma flecha envenenada, após uma batalha no pé do morro onde hoje fica o Outeiro da Glória.
Esse capítulo do Rio foi retirado do gabinete de Luiz Fernando Pezão. Com um estado agonizante nas mãos, o governador concluiu que a obra estava “carregada”.

A condenação do quadro veio após uma visita de Jorge Ben Jor, que deu três batidinhas na moldura e disse: “Está muito carregado, tira”. Especialistas ouvidos pelo EXTRA discordam. Para economistas, historiadores e cientistas políticos, o verdadeiro quadro que trouxe o “mau agouro” para o estado foi uma combinação de falta de planejamento estratégico, clientelismo e uma sucessão de acontecimentos históricos que desfavoreceram o Rio, sem que políticas públicas fossem idealizadas para compensar as perdas.
— Nos anos 20, o Rio foi superado por São Paulo. Dos anos 20 aos anos 60, São Paulo, com seu complexo cafeeiro e a industrialização, continua a ser o estado que mais cresce, mas o Rio acompanhava o ritmo do país — explica o economista Mauro Osorio, um dos autores do livro “Uma agenda para o Rio de Janeiro”: — Em 1960, a capital é transferida para Brasília, mas houve uma demora para perceber o problema. Há uma carência de reflexão, que dificulta a construção de estratégias regionais. O Rio foi perdendo e nada foi posto no lugar.
Após o golpe militar, o vazio criado pela cassação de lideranças políticas virou cenário perfeito para o clientelismo do governador Chagas Freitas. A política do “toma lá dá cá” perdura até hoje com um leve período de melhora durante o governo Cabral, destaca Osório.
— A responsabilidade é diluída entre os governadores do Rio. Governante pensar em horizonte a longo prazo é exceção — diz Júlio Miragaya, presidente do Conselho Federal de Economia, apontando um desafio que vai além de trocar um quadro de parede.
Pezão diante do quadro, ainda em seu gabinete
Pezão diante do quadro, ainda em seu gabinete Foto: Fábio Guimarães / 18.06.2015

‘Foi a primeira morte carioca’
Nascido em Niterói, em 1860, onde hoje um museu carrega seu nome, Antônio Parreiras concluiu o quadro “Alegoria da morte de Estácio de Sá” em 1911, após encomenda de Inocêncio Serzedelo Corrêa, prefeito da então capital federal. Admirador da obra do pintor, o historiador Milton Teixeira não aprovou o descarte da tela.
— Ela retrata a primeira morte genuinamente carioca: por flecha perdida. Mas não podemos exigir que um governador que faliu a saúde, a educação e o estado como um todo entenda de arte. Se não quiserem o quadro, ele seria muito bem tratado na minha casa — garante Milton, que já tem uma obra de Antônio Parreiras na sala: — Não tem um décimo do valor.
Debates artísticos à parte, especialistas são unânimes ao apontar a falta de planejamento de médio e longo prazo como uma das causas para o momento vivido pelo Estado do Rio. Um problema que começou há décadas e persistiu nas gestões mais recentes, de Pezão e Sérgio Cabral, de quem o atual governador foi vice.
— Sobretudo por ser um governo de continuidade, é lamentável que se chegue a esse ponto — resume o cientista político e professor da UFRJ Jairo Nicolau.
— O Estado do Rio sempre se beneficiou com o petróleo, mas houve mudança na legislação e a queda acentuada no preço do barril. Se, anteriormente, o bom momento fosse aproveitado para a redução de despesas, em vez de aumentar gastos, nossa situação seria outra — assegura Jerson Carneiro, professor de Direito Administrativo do IBMEC.
O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS
Jairo Nicolau, Cientista político e professor da UFRJ:
“A dependência apenas do petróleo é uma maldição para vários países. Aconteceu no Chile, com o cobre. Se aquele produto cai, ou entra em colapso, fica-se na penúria. E só a capital do Rio é maior do que muitos países europeus”.
Júlio Miragaya, presidente do Conselho Federal de Economia:
“O Rio perdeu para Brasília rendimentos e tributos de empresas públicas. Depois, o petróleo virou o elemento motriz do estado. A retração da economia do petróleo teve impacto profundo”.
Jerson Carneiro, professor de Direito Administrativo do IBMEC:
“Está estourando no Pezão, mas a culpa é de todos, inclusive dele próprio. O governador, agora, precisará ter criatividade para dialogar com a iniciativa privada e tirar o estado dessa crise”.

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