Aliados preparam ofensiva para levar PMDB ao comando do país
BRASÍLIA E RECIFE - A saída do ministro Eliseu Padilha do governo na
última sexta-feira foi vista pela ala pró-impeachment do PMDB como a
senha para que se iniciem abertamente os trabalhos para garantir o
vice-presidente Michel Temer no comando do país. Nas horas que se
sucederam à notícia do pedido de demissão, a frase mais proferida pelos
peemedebistas resume o espírito da saída: “Padilha é o Temer”. Mas o
abismo criado entre os palácios da Alvorada — residência oficial da
presidente Dilma Rousseff — e do Jaburu — a de Temer — vem sendo cavado
há meses. Padilha é apenas o último dos aliados mais íntimos do
vice-presidente a se distanciar do governo. Os outros há muito já se
movimentavam pela abertura do processo de impeachment. Em Recife, onde
esteve ontem, Dilma disse contar com a “confiança” de Temer para
enfrentar o processo de impeachment no Congresso:
— Eu
espero integral confiança do Michel Temer e tenho certeza que ele a
dará. Ao longo desse tempo, eu desenvolvi a minha relação com ele e
conheço o Temer como pessoa, como político e como grande
constitucionalista.
Enquanto a presidente discursava no Recife,
Temer se encontrava com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin
(PSDB), em almoço organizado pelo empresário Jorge Chammas, do Moinho
São Jorge. Amanhã, os dois estarão juntos novamente, em evento público
no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista. Segundo aliados,
Temer e o tucano conversaram brevemente. Na última quarta-feira, horas
antes do anúncio da decisão de Eduardo Cunha de acatar o pedido de
impeachment, Temer recebeu senadores do PSDB e do DEM. Os tucanos já
discutem com setores do PMDB um eventual governo de transição.
Em
Belo Horizonte, durante um congresso do PDT, o ex-ministro da Integração
Nacional no primeiro governo Lula, Ciro Gomes, acusou Temer de estar à
frente do movimento pelo impeachment de Dilma.
— Eu acuso o senhor Michel Temer de ser o capitão do golpe — disse Ciro, acrescentando que o impeachment é um “remédio grave”.
A estratégia do grupo peemedebista pró-impeachment é manter Temer na retaguarda, enquanto eles ocupam a linha de frente.
—
Temer não precisa se mover agora. Tem que deixar as ondas baterem nas
pedras para ver a espuma que fará, como as ruas vão se manifestar, como
as forças no Congresso vão se aglutinar. Ele foi menosprezado pelo PT o
tempo inteiro, e agora vem o senhor Jaques Wagner querendo ganhar no
grito para cima dele. Ele não vai aceitar constrangimento de ninguém —
disse o ex-deputado Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), um dos integrantes do
núcleo político de Temer.
Perguntado se Temer vai segurar o grupo para não trabalhar pelo impeachment, Geddel respondeu:
— Ele não tem condições de segurar o grupo. Tem só que ficar na dele.
PADILHA CUIDARÁ DO MAPEAMENTO DE VOTOS
A
ala pró-Temer diz que Padilha, expert em planilha e controle de votos
desde a Constituinte, começa a trabalhar a partir de amanhã no gabinete
da presidência do PMDB, que fica na Câmara dos Deputados.
Outro
membro atuante do grupo do vice-presidente é o ex-governador e
ex-ministro Moreira Franco, autor do “Plano Temer”, apelido que ele
mesmo deu ao programa de governo elaborado pelo PMDB no mês passado,
contendo medidas opostas às adotadas por Dilma. O documento, escrito
após consultas a vários economistas próximos ao partido, foi
interpretado como um programa de transição a ser adotado após a saída da
presidente e, ao mesmo tempo, como um sinal para o mercado financeiro e
o setor produtivo.
Ao ser apresentado aos peemedebistas, em um
congresso da Fundação Ulysses Guimarães, presidido por Moreira, o
vice-presidente da República foi recebido com um coro de “Temer, veste a
faixa já”. Na base do partido, o sentimento há muito tempo é pela
ruptura.
— O impeachment está posto e certamente será uma grande
contribuição para que possamos recuperar 2015, um ano que se perdeu na
queda de braço entre a presidente Dilma e Eduardo Cunha, e de retomarmos
o esforço de criar condições para que possamos sair da maior crise
econômica da História — afirmou Moreira.
Geddel sempre resistiu à
manutenção da aliança com o PT no governo Dilma. Aliado de Aécio Neves
em 2014, ele circula em Brasília entre o Palácio do Jaburu e o gabinete
do irmão, o deputado Lúcio Vieira Lima. Não por coincidência, Lúcio é um
dos 22 deputados peemedebistas que trabalham abertamente pelo
afastamento da presidente. Nesse grupo está também o deputado Osmar
Terra (RS) — que, tão logo o presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), deu andamento à ação contra Dilma, foi ao Jaburu conversar
com a cúpula partidária.
— Geddel é o nosso Estado Islâmico, o
homem-bomba do partido — resumiu um peemedebista da cúpula ao GLOBO
sobre a atuação do baiano quando o assunto é impeachment.
Fora do
núcleo mais próximo de Temer, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) defende
abertamente o impeachment desde o início do ano. Com presença menos
frequente nas reuniões quase diárias que ocorreram nas últimas semanas à
noite no Palácio do Jaburu, o peemedebista se reaproximou. Nos
bastidores, Jucá atua entre políticos, empresários e representantes do
mercado financeiro na defesa de que só com uma mudança de ares seria
possível recuperar a economia do país.
Em meio à crise política,
interlocutores da presidente sondaram uma possível volta de Jucá à
liderança, ao que o peemedebista ironizou a aliados:
— O Titanic está afundando, e querem me dar um camarote? Tô fora.
Apesar
de afastado do núcleo do vice, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha,
teve o papel decisivo de abrir o processo do impeachment. No partido, é
considerado um “outsider” por peemedebistas históricos. Provocou atritos
com diversas raposas do PMDB, como o presidente do Senado, Renan
Calheiros (AL), com quem mantém relação protocolar.
Dizem ainda
que ele “forçou” proximidade com Temer, mas que o vice sempre manteve
uma “distância de segurança”. Na quarta-feira, minutos antes de dar
entrevista coletiva anunciando que acolheria o pedido de impeachment,
Cunha telefonou a Temer. Segundo relatos, o vice-presidente nada fez
para impedi-lo.
Na oposição ao grupo pró-impeachment, o líder do
PMDB na Câmara, Leonardo Picciani (RJ), trabalha para manter o apoio do
partido a Dilma. Picciani articula a ocupação pela bancada do PMDB na
Câmara das pastas que venham a ser deixadas pelo grupo de Temer, o que
reforçaria a base de sustentação de Dilma na Casa.
— Se as ruas se engajarem, o senhor Picciani não vai segurar o impeachment. Já vimos esse filme antes — atacou Geddel.
Já Moreira evitou a referência direta:
—
O voto para decidir o impeachment será aberto e evidentemente fruto de
uma avaliação pessoal de cada parlamentar. E a população vai avaliar o
voto de cada um.
A presidente Dilma disse que como não conversou com Padilha, não considera a saída do peemedebista definitiva:
—
Eu me esforcei bastante para manter na reforma ministerial o ministro
Padilha no governo. Por quê? Porque achava, e acho ainda, que o ministro
Padilha está fazendo um trabalho muito importante. Eu não recebi
nenhuma comunicação do ministro Padilha e eu ainda conto com a
permanência do ministro no governo.
QUEM SÃO:
Moreira Franco -
Manteve uma postura governista até ser demitido pela presidente Dilma
na virada do primeiro para o segundo mandato. Foi o coordenador do
programa de governo divulgado pelo PMDB no mês passado, contendo medidas
opostas às adotadas por Dilma. O documento foi interpretado como um
programa de transição a ser utilizado após a saída da presidente por um
possível impeachment.
Eliseu Padilha - Um dos
mais fiéis aliados de Temer, deixou o governo na sexta-feira. Ele mantém
planilhas sobre a fidelidade dos partidos da base aliada nas votações
e, quando atuou na articulação política, mapeou e ajudou a nomear os
ocupantes dos cargos que cada partido tem em Brasília e nos estados.
Segundo peemedebistas, a partir de amanhã ele começa a trabalhar com
esses dados na sede do partido.
Geddel Vieira Lima -
Ministro da Integração Nacional durante o governo do ex-presidente
Lula, afastou-se do PT em 2010. Apesar de ter assumido uma
vice-presidência da Caixa no primeiro mandato de Dilma, a pedido de
Temer, ele sempre resistiu à manutenção da aliança com o PT. Ano
passado, aliou-se a Aécio Neves (PSDB-MG) e tornou-se um dos mais duros
críticos da presidente.
Romero Jucá - Ex-líder do
governo Lula e do primeiro mandato de Dilma Rousseff, externou seu
rompimento com o governo no ano passado e apoiou Aécio Neves à
Presidência da República. Nos últimos meses, no entanto, reaproximou-se
de Temer e passou a frequentar o Palácio do Jaburu, residência oficial
do vice. Defende que só com uma mudança de presidente seria possível a
economia voltar a crescer.
Nenhum comentário