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Angélica, babá de foto polêmica, diz que é a favor dos protestos

Bruno Alfano

“Patrão, tem paparazzo lá embaixo?”. Maria Angélica Lima, de 45 anos, nunca achou que teria esse tipo de preocupação. Era para ser um domingo como qualquer outro do último ano, em que trabalhou cuidando, aos fins de semana, dos gêmeos de um morador de Ipanema. Mas uma foto, a caminho das manifestações de Copacabana neste domingo, a colocou no centro dos debates. E a repercussão assustou.
— Me senti exposta — explica. — Acordei e vi minha cara no jornal. Foi um susto.
Foto acendeu debates nas redes sociais
Foto acendeu debates nas redes sociais Foto: João Valadares/CB/Da Press
A imagem mostra Angélica empurrando o carrinho de bebês com os filhos dos patrões, que estão ao lado. Moradora de Nova Iguaçu, ela estudou até o ensino médio. O serviço era para desafogar as contas da casa onde vive com o marido e as filhas, de 2 e 16 anos. Mesmo assim, a crise sufocou.
— O pobre é que sofre. O preço da comida aumentou muito. Íamos reformar a casa, mas não vai dar — conta.
As três Marias: Maria Angélica (a mãe), Maria Júlia, de 16 anos, e Laura Maria, de 2 anos
As três Marias: Maria Angélica (a mãe), Maria Júlia, de 16 anos, e Laura Maria, de 2 anos Foto: Marcelo Theobald /  O Globo
A solução, para a babá, não passa por tirar a presidente Dilma Rousseff do cargo da presidência. Não acredita no vice, Michel Temer (PMDB). Para ela, “nenhum deles presta”. Nas eleições de 2014, Angélica votou duas vezes em Aécio Neves (PSDB). Ela diz que acredita nas propostas do mineiro. A babá também admira a figura do juiz Sérgio Moro, que já condenou 67 pessoas na Operação Lava Jato.
— A solução do Brasil começa por mudar o Congresso todo — sonha Angélica.
Charge foi publicada no Facebook uma semana antes da fotografia de Angélica com os patrões
Charge foi publicada no Facebook uma semana antes da fotografia de Angélica com os patrões Foto: Reprodução/Facebook
O furacão que transformou a babá em ponto de discussão nas redes sociais tem origem, segundo o cientista política Paulo Baia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, na polarização dos debates sobre os atos contra a presidente.
— De um lado, há os que são a favor de Dilma e vão dizer que há discriminação ali, porque é uma negra numa manifestação onde só vai rico — pontua Baia. — O outro lado diz o inverso. Afirma que a imagem é de uma família bem-sucedida, lutando contra a corrupção, que contrata legalmente. Esse é o foco da briga.
Confira a entrevista com a babá Angélica
O que você achou de ir à manifestação de anteontem?
Eu não estava fazendo nada demais. Estava no meu horário de trabalho, cumprindo a minha função. Ele, como meu patrão, estava indo à manifestação. E eu estava indo com eles para acompanhar as crianças. Eu tenho que estar perto. E só. Mais nada.
A senhora foi obrigada?
Não. Claro que não.
Maria Angélica
Maria Angélica Foto: Marcelo Theobald
Iria se estivesse de folga?
Eu iria se tivesse morando lá embaixo (na cidade do Rio). Ir daqui (Nova Iguaçu) para lá é bem difícil. Pego dois ônibus para ir trabalhar.
Você é a favor dos atos?
Sou. Mas queria que isso tudo acontecesse, e tivesse resultado. Falei para o meu patrão: “As pessoas querem o impeachment e que as coisas mudem, mas não vai mudar”. A presidente Dilma saindo, quem entrar vai continuar roubando. O Brasil é assim. Quem está com dinheiro, como os políticos, vai continuar tudo bem. A gente que vai sempre levar a pior.
Por que votou no Aécio?
O Lula não foi aquele presidente que todo mundo esperava. Aí, votei no Aécio para dar uma oportunidade de que ele mudasse o quadro. Mas entrou a Dilma e a gente está vendo esse resultado.
Maria Angélica Lima com as duas filhas na sala de casa
Maria Angélica Lima com as duas filhas na sala de casa Foto: Marcelo Theobald
Você trabalha na semana?
Não. Quero curtir a infância da minha filha mais nova.
Quem cuida das suas filhas quando está no trabalho?
Meu marido trabalha às vezes no fim de semana. Então, a gente contrata uma menina, que mora aqui perto, para tomar conta da menorzinha.
O que acha de usar uniforme?
Acho que é um dever que a gente tem. Desde o momento que a gente trabalha e tem uniforme, a gente tem de usar. Tem casas que não pedem, outras precisam. Eu acho até melhor porque preserva mais as nossas roupas. E tudo eles que dão. Eles dão sapato, calça, bermuda, blusa. Minha patroa que fornece.
Como a senhora soube de que estava nas redes?
Meu patrão que me mostrou. Ele disse: “Olha, Angélica, está acontecendo uma coisa chata”. E me explicou o que era. Eu falei: “Sinceramente, seu Cláudio, eu não estou nem entendendo nada disso”.
Gostaria de falar algo a quem debateu nas redes sociais?
Não fiquem preocupados. Quem me apoiou, sabe do valor da gente, que é babá, de trabalhar, de ter nosso dinheiro. A gente tem de dar valor ao trabalho, independente de usar de uniforme ou não.
Polêmica na rede
Muitos internautas enxergaram na imagem um retrato da desigualdade social do país. Já outros apontaram para uma simbologia das condições de subemprego a que algumas empregadas domésticas estão submetidas.

Do outro lado, muitas pessoas defenderam a presença da babá em meio ao protesto. Entre os argumentos, a ideia de que pelo menos a funcionária não está desempregada.
Patrão se manifesta
O patrão de Angélica é o vice-presidente de Finanças do Flamengo, Claudio Pracownik. Ele se manifestou pelo Facebook sobre a polêmica. Confira o texto:
"Sí Pasarán!"
Ganho meu dinheiro honestamente, meus bens estão em meu nome, não recebi presentes de construtoras, pago impostos (não, propinas), emprego centenas de pessoas no meu trabalho e na minha casa mais 04 funcionários. Todos recebem em dia. Todos têm carteira assinada e para todos eu pago seus direitos sociais.
Não faço mais do que a minha obrigação! Se todos fizessem o mesmo, nosso país poderia estar em uma situação diferente
A babá da foto, só trabalha aos finais de semana e recebe a mais por isto. Na manifestação ela está usando sua roupa de trabalho e com dignidade ganhando seu dinheiro.
A profissão dela é regulamentada. Trata-se de uma ótima funcionária de quem, a propósito, gostamos muito.
Ela é, no entanto, livre para pedir demissão se achar que prefere outra ocupação ou empregador. Não a trato como vítima, nem como se fosse da minha família. Trato-a com o respeito e ofereço a dignidade que qualquer trabalhador faz jus.
Sinto-me feliz em gerar empregos em um país que, graças a incapacidade de seus governantes, sua classe política e de toda uma cultura baseada na corrupção vive uma de suas piores crises econômicas do século.
Triste, só me sinto quando percebo a limitação da minha privacidade em detrimento de um pensamento mesquinho, limitado, parcial cujo único objetivo é servir de factoide diversionista da fática e intolerável situação que vivemos.
Para estas pessoas que julgam outras que sequer conhecem com base em um fotografia distante, entrego apenas a minha esperança que um novo país, traga uma nova visão para a nossa gente. Uma visão sem preconceitos, sem extremismos e unitária.
O ódio? A revolta? Estas, deixo para eles."

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