Ação contra Lula traz risco de venezuelização ao Brasil
Para ministros, devem crescer confrontos entre críticos e opositores do governo
KENNEDY ALENCAR
BRASÍLIA
BRASÍLIA
Numa primeira leitura, feita na manhã desta sexta por
dois ministros, a ação da Operação Lava Jato contra o ex-presidente Lula
acirrará ainda mais o debate político _inclusive com riscos de
confrontos físicos mais graves nas ruas.
Existe uma preocupação com possíveis enfrentamentos nos protestos
previstos para 13 de março, tanto em relação aos críticos do governo,
como também da parte dos apoiadores de Lula e da presidente Dilma
Rousseff.
Há também uma avaliação de que esta fase da Lava Jato, a Aletheia,
teria sido uma resposta dos investigadores, sobretudo da Polícia
Federal, à saída de José Eduardo Cardozo do Ministério da Justiça.
Nos bastidores, o Palácio do Planalto já esperava uma operação desse
tipo, mas o momento de executá-la teria sido adiantado pela saída de
Cardozo da Justiça, numa tentativa de mostrar que não haverá
interferência do novo ministro, Wellington César.
Teria pesado também, na visão do governo, o recurso da defesa do
ex-presidente para que o Supremo Tribunal Federal decidisse se caberia
ao Ministério Público de São Paulo ou aos investigadores em Curitiba,
procuradores da República e policiais federais, investigar Lula. Antes
que a ministra e relatora Rosa Weber se manifestasse e, por ventura,
decidisse que as propriedades do apartamento no Guarujá e de um sítio em
Atibaia deveriam ficar a cargo do Ministério Público de São Paulo, a
força-tarefa da Lava Jato decidiu colocar o time na rua.
Dois ministros consideram que a condução coercitiva de Lula tem peso
político forte, seja para desgastá-lo perante os críticos, seja para
vitimizá-lo diante dos apoiadores.
*
Análise e opinião
Politicamente, está certa a leitura de ministros de que haverá
acirramento do debate político. Não deve ser menosprezada a
possibilidade de confrontos nas ruas entre apoiadores e críticos de
Lula. Um ingrediente de venezuelização não deve ser descartado. E ele é
perigoso. Nesse contexto, é preciso que haja moderação das autoridades
públicas, sejam do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.
Do ponto de vista jurídico, será um teste importante para a Lava
Jato. Lula é o político mais poderoso a ser alvo concreto da operação.
Será necessário analisar a consistência dessas investigações.
Haverá uma entrevista dos investigadores hoje, como é de praxe, para
falar das razões das diligências. Parece que está estabelecido um
processo que ganhou dinâmica própria e que é incontrolável. Hoje, Lula e
o PT são os mais atingidos.
No entanto, a oposição, em algum momento, será objeto de interesse da
Lava Jato. As delações dos executivos da Andrade Gutierrez devem
desnudar um modelo de negócios da política brasileira.
O aprofundamento da Lava Jato tende a apurar não só eventuais crimes
cometidos por quem está no poder, mas também pode chegar a quem se
beneficia dessa engrenagem de financiamento político em que a corrupção
para enriquecimento pessoal é apenas uma das suas facetas.
Um político como Lula, se quisesse enriquecer pessoalmente de forma
corrupta, poderia ter muito mais que um apartamento no Guarujá ou um
sítio em Atibaia, bens dos quais, aliás, ele nega ser proprietário.
Há em relação ao apartamento e ao sítio um componente maior de troca
de favores do que uma ação para tirar benefício da corrupção na
Petrobras. É errada a troca de favores em relação a um ex-presidente,
sobretudo se ele pode voltar a ser candidato à Presidência.
Mas é importante ver que detalhes de apuração a Lava Jato tem para
sustentar uma decisão tão ousada como a de hoje. Ninguém está acima da
lei. Nesse sentido, Lula precisa responder às acusações. Mas é
necessário que não haja abuso em relação a ele nem aos cidadãos de forma
geral.
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