Mensagens em celular de empreiteiro mostram que Cunha negociou MP com empresas da Lava Jato
SÃO
PAULO — O ex-presidente da Câmara, deputado afastado Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), negociou o texto da Medida Provisória 627, que é alvo da
Operação Zelotes por suspeita de beneficiar o setor automotivo, também
com empreiteiras investigadas na Lava Jato. Mensagens anexadas ao
inquérito da empreiteira Andrade Gutierrez mostram que Cunha, que foi
relator da MP, pode ter atendido a interesses da empreiteira. Em dezembro, o GLOBO mostrou que Cunha pediu “segredo” em mensagem enviada ao ex-presidente da construtora, Otávio Azevedo.
A
MP tratou da tributação de lucros de filiais de empresas brasileiras no
exterior. No texto aprovado pela Câmara, porém, foi incluída até mesmo
permissão para a criação de aeroporto privado destinado a operar voos
comerciais, o que acabou sendo vetado pelo governo. A Andrade Gutierrez
pretendia investir R$ 5,3 bilhões para construir um novo aeroporto em
São Paulo, no município de Caieiras. Pela lei, voos comerciais só podem
ser operados em aeroportos públicos ou em regime de concessão.
Otávio
Azevedo acompanhou a negociação da MP de perto. Gabriel Villas Boas,
então diretor de relações institucionais da empreiteira, chegou a enviar
a ele uma mensagem de WhatsApp com foto da reunião realizada no dia 20
de março de 2014, poucos dias antes da MP ser levada à votação na
Comissão Especial e no plenário da Câmara.
A foto mostra os
principais representantes do PMDB reunidos para tratar do assunto com o
então ministro da Fazenda, Guido Mantega. Além de Cunha, estiveram
presentes Michel Temer, que era vice-presidente, e Eduardo Braga, na
época líder do PMDB no Senado.
Um dia antes da votação no
plenário, Azevedo manda mensagem a Cunha perguntando se as modificações
propostas pela Odebrecht (CNO) estavam aceitas pelo governo e pela
Câmara.
Cunha responde que acertou um dos dois pontos enumerados:
"Esse ponto 1 eu acertei mas tem de ser em segredo". No dia seguinte à
aprovação da MP, Otávio Azevedo, e Leo Pinheiro, da OAS, trocaram
mensagens sobre terem que trabalhar para o governo não vetar. Para a PF,
o assunto era a medida provisória.
No dia 30 de junho, Cunha
informa por WhatsApp números de contas para Azevedo. Segundo relatório
de análise da PF, são, aparentemente, doações eleitorais ao PMDB e à
campanha do ex-ministro Henrique Eduardo Alves, que era candidato ao
governo do Rio Grande do Norte em 2014. Também é informado um CNPJ :
“CNPJ da minha pessoal 20.565.087/0001-51”.
No dia seguinte, Cunha envia mensagem perguntando sobre o depósito de Henrique: ”Fez Henrique????”
Cunha afirmou ao GLOBO que que a MP foi discutida com vários setores:
“Com
relação à MP 627, várias matérias foram discutidas, não só com os
setores, como também com o Governo, através de troca de e-mails. Quanto a
passar dados de contas de Henrique Alves, não há nada além de uma
solicitação transparante de doação legal”, disse.
A Andrade
Gutierrez afirmou, em nota, que mantém o compromisso de colaborar com a
Justiça. “Além disto, tem feito propostas concretas para dar mais
transparência e eficiência nas relações entre setores público e
privado”, informou.
Nenhum comentário