Ritual do processo de afastamento de Dilma começa nesta quinta-feira
BRASÍLIA
- O pedido de impeachment acolhido nesta quarta-feira pelo presidente
da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi escolhido entre os mais de 30
pedidos recebidos pela Casa nos últimos meses por razões técnicas e
políticas. Politicamente, o pedido apresentado em conjunto pelos
juristas Miguel Reale Junior, Hélio Bicudo e Janaína Paschoal era o que
maior respaldo encontrava entre os defensores do impeachment, por ter
sido encampado pela oposição e por alguns movimentos de rua, como o
Movimento Brasil Livre, Vem pra Rua e Movimentos Contra a Corrupção.
Tecnicamente,
outro motivo fundamental para Cunha ter escolhido este, entre as
dezenas que tinha à mão, foi o fato de abordar as “pedaladas” fiscais de
2015. Desde o início do ano, Cunha afirmava que não aceitaria nenhum
pedido que abordasse supostos crimes cometidos antes do atual mandato —
até porque ele mesmo é suspeito de atos cometidos antes deste mandato.
O
caminho do impeachment envolve várias fases. O pedido, que tem mais de
duas mil páginas, será lido na sessão de hoje, às 14h, assim como a
decisão de Cunha. A comissão especial do impeachment deverá ser criada
ainda hoje e, segundo a assessoria da Câmara, deverá ter 66 integrantes,
número máximo de membros, de acordo com o regimento da Casa. Ainda
hoje, a presidente Dilma Rousseff deve ser notificada. A partir do
recebimento da notificação, ela terá dez sessões da Câmara para
apresentar defesa.
REUNIÃO DE LÍDERES COM CUNHA
Os
líderes dos partidos se reúnem com Cunha às 11h30m, para discutir o
andamento do processo. A divisão entre as legendas, também segundo
entendimento da Câmara, obedecerá à proporcionalidade dos blocos
partidários formados na eleição da Mesa, no início deste ano. A lei do
impeachment exige que todos os partidos sejam representados na comissão.
Na Câmara, 29 partidos tem deputados atualmente.
Cunha dará ainda
hoje o prazo de até 48 horas para os líderes indicarem seus
representantes na comissão, sem contar o fim de semana. Os nomes serão
submetidos ao plenário. Quando eles forem aprovados, a comissão estará
formalmente constituída. A partir daí, a comissão terá até 48 horas para
eleger os 66 integrantes, o presidente e relator.
Depois do
recebimento da defesa de Dilma, a comissão terá cinco sessões para dar
seu parecer e este será votado. Após 48 horas, a decisão será incluída
na ordem do dia do plenário. Para ser aprovado o pedido de abertura do
processo de perda de mandato e afastamento de Dilma, são necessários 342
votos.
Durante o recesso parlamentar, a comissão não funcionará, a menos que haja convocação extraordinária.
Se
o processo for aberto na Câmara, Dilma será afastada do cargo até o
julgamento final. E, nesse período, ainda receberá apenas a metade de
seu salário, de R$ 27,8 mil. Dilma, então, passará a responder
formalmente junto ao Senado por crime de responsabilidade.
A
presidente poderá comparecer pessoalmente para se defender na sessão do
Senado, que será presidida pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski.
As testemunhas poderão ser inquiridas na sessão por parlamentares. Pode
haver debate entre parlamentares e Dilma, ou seu advogado, pelo prazo
máximo de duas horas. Em votação nominal, os 81 senadores julgarão. São
necessários também dois terços, ou 54 votos, para se aprovar o
impeachment.
Os autores do pedido escolhido por Cunha chegaram a
desistir de uma acusação apresentada anteriormente, mas que não incluía
as “pedaladas” de 2015. Orientada pelo próprio Cunha, a oposição atuou
na formulação do novo pedido, utilizando boa parte do material anterior,
mas acrescentando a rejeição das contas do governo pelo Tribunal de
Contas da União (TCU), para reforçar a tese de que as “pedaladas”
invadiram o segundo mandato de Dilma, caracterizando “continuidade
delitiva”.
A acusação cita ainda o fato de o Tribunal Superior
Eleitoral ter apurado a existência de irregularidades na prestação de
contas da campanha à reeleição e ter reaberto o julgamento do caso.
MOMENTO “NOTORIAMENTE GRAVE”
Em
sua decisão, Cunha afirma que as acusações são “gravíssimas”, ressalta
que o momento político atual é “notoriamente grave” e diz que “nunca, na
história da República, houve tantos pedidos de impeachment”. Cita o
parecer do TCU que, por unanimidade, recomenda a rejeição das contas do
governo e afirma que a aprovação da mudança da meta fiscal, ontem, não
sanará a situação.
“Não ignoro ter o Poder Executivo enviado ao
Congresso Nacional projeto de lei alterando a meta fiscal de 2015,
porém, além de pendente de apreciação, mesmo se for aprovado, não altera
a realidade dos fatos: até o presente momento, o Poder Executivo,
comandado pela denunciada, administrou o Orçamento de 2015 como se a
situação fosse superavitária, quando o déficit estimado pode chegar a R$
100 bilhões de reais”, diz Cunha.
O líder da Rede, Alessandro Molon (RJ), criticou o suposto uso do cargo pelo presidente para retaliar o PT:
—
Mais uma vez fica evidente que Cunha usa a presidência da Casa para
atrapalhar o avanço do processo e punir quem se coloca em seu caminho.
A
OAB disse que mantém sua posição de analisar os elementos levantados
pelos órgãos de controle e pela imprensa e dar uma resposta com
embasamento técnico-jurídico para a sociedade: “O assunto está sob
análise do Conselho Federal da OAB, que levará em conta, para opinar, as
pedaladas fiscais, a prisão do líder do governo no Senado e delações
premiadas que dão conta de um amplo esquema de corrupção no seio do
governo”.
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